quarta-feira, 15 de abril de 2009

Introdução ao Livro de Juízes

I) Síntese do livro

1. Autoria
Conquanto não se conheça a autoria do livro, o Talmude atribui a Samuel. Provavelmente ele escreveu porções deste livro.
Os juizes exerceram a função de liderança civil e militar e não necessariamente jurisdicional, pelo que julgavam as questões civis e libertavam o povo dos opressores. Moisés instituiu a nomeação de juízes Ex 18.13-27, Dt. 16.18.

2. Data
O livro de Juízes foi escrito por volta de 990 a.C, antes da conquista de Jerusalém por Davi.
Os acontecimentos desse livro reportam-se ao ano de 1380 a 1050 a.C, e versam sobre a crise política, moral e espiritual de Israel, intermediando a conquista da Palestina até o começo da Monarquia.

3. Breve Sumário histórico
Nesse período a nação de Israel assemelhava-se a uma confederação, cujas tribos constituíam as unidades federativas. Não havia uma liderança central forte. E o decurso desse período denota a carência de uma liderança pujante, estável e espiritual.
Após a liderança de Josué, restaram alguns grupos cananitas na terra prometida, cuja conquista completa caberia às tribos de Israel. Contudo estas não prosseguiram na conquista segundo a determinação de Deus.
O povo de Israel não cumpriu o mandado de Moisés, a saber, o de destruir todos os Cananitas. Essa rebelião custou caro aos israelitas, porquanto foram amiúde atacados e subjugados pelos inimigos. Se obedecessem a ordem divina jamais enfrentariam essas crises.
Por conseguinte, houve uma instabilidade espiritual no meio do povo. Sucedeu discórdias entre as tribos, desorganizações, que culminaram em diversas guerras internas. Ora o povo aproximava-se do Senhor, ora afastava-se. Cada qual fazia o que parecia direito aos seus olhos (17.6).
O livro de Juízes se distingue do livro de Josué, enquanto este retrata as vitórias do povo de Deus em função da obediência, aquele salienta as derrotas do povo de Deus em virtude da desobediência.
O último capítulo desse livro destaca a profunda apostasia do povo, ao narrar a idolatria do levita, descendente de Moisés (18.30), depravação e crueldade da tribo de Dã, homossexualismo, estupro, prostituição, adultério e homicídio. Algo que jamais ocorrera em Israel.

4. Esboço do Livro
I- O contexto do Período dos Juízes 1.1-3.6
II- A história do Período dos Juízes 3.7-16.31
III- A apostasia do Período dos Juízes 17.1-21.25

II) Pressupostos do trabalho
Embora seja redundante – estudando no SBPV e fazendo um trabalho direcionado ao SBPV – é pertinente frisar que o autor do trabalho advoga pela autoridade e inerrância das Escrituras Sagradas, sendo, portanto, histórica e teologicamente fidedigna.
O livro objeto do presente estudo é inspirado por Deus (2Tm 3.16). E possui o escopo histórico-redentivo. De sorte que nem é um livro histórico no sentido moderno e ocidental e tampouco um livro puramente espiritual sem veracidade histórica.

III) Cronologia do Livro
Antes de adentrar em qualquer assunto acerca da historicidade do livro, será imprescindível fixar a cronologia do livro, visto que a partir da cronologia perfilhada será possível traçar o respectivo paralelo com dados externos do livro.
Desde já torna-se mister ressalvar que a especificação de datas não é tarefa fácil, sendo pertinente não olvidar as palavras do insigne mestre Carlos Osvaldo Pinto em suas sempre elucidativas e costumeiras notas de rodapé: “A cronologia de Juízes é extremamente complexa e ninguém detém o monopólio da verdade” (PINTO, 2006, p. 221).
O livro cobre um período bem amplo da história de Israel, a saber, aproximadamente 300 anos. Como é possível chegar a esse período? Haja vista o pressuposto perfilhado pelo autor, os textos de 1Re 6.1 e Jz 11.26 são literais, ipsis litteris.
O primeiro texto assevera que no ano quarto do reinado de Salomão o povo de Israel havia saído do Egito há 480 anos[1]; o segundo afirma que no período de Jefté, o povo já ocupava a terra há 300 anos. É pacífico que o reino se dividiu no ano 930 a.C. É possível chegar a essa data, por exemplo, em virtude do cotejo das listas de limmu ou epônimos, listas assírias contendo a história do império de 893 a 666 a.C, com textos históricos e listas de reis. Por conseguinte, fazendo-se uma contagem decrescente, de modo a computar-se 116 anos para Salomão (36 anos, 1Re 11.42), Davi (40 anos, 1Re 2.11), Saul e seus sucessores (40 anos, At 13.21), consegue-se datar aproximadamente os seguintes períodos: a) o período do êxodo aproximadamente em 1445 a.C, b) da ascensão de Samuel, aproximadamente em 1.050 a.C.
No entanto, a soma total do período dos juízes totaliza aproximadamente 410 anos; tempo incompatível com a cronologia apontada nos textos de 1Re e Jz, que possibilitariam um tempo de 300 anos para o período dos juízes.

Portanto, como harmonizar os períodos descritos no livro de Juízes com os textos citados? Uma solução consiste em considerar que houve justaposição de juízes, de modo que houve juizados concomitantes, por exemplo, o juizado de Tola e Jair seriam concomitantes, bem como o de Jefté, Ibzã, Elom, Abdom e Sansão, todos perfazendo 40 anos correspondendo ao período dos filisteus.

Conforme dito alhures, a especificação de datas é muito difícil ou quase impossível. Com efeito, ninguém detém o monopólio da verdade. Há carência de dados específicos. O texto bíblico não informa o tempo de duração da liderança de Josué. Somente menciona que no tempo da conquista Calebe estava com 85 anos e tinha 40 quando foi enviado como espia (Js 14.7,10).
Até entre os conservadores há discrepâncias. Por exemplo, Archer[4] defende que o início dos acontecimentos é datado em 1381, ao passo que Merrill[5] defende o período de 1360-1350. Todavia isso verifica-se em função do escopo teológico do livro.
Uma proposta de adaptação, consiste em considerar que “a opressão amonita seguiu-se ao juizado de Jair, que a opressão sob Jabim aconteceu nos anos finais do juizado de Eúde, e que partes de anos são contadas como anos inteiros”[6].
Por outro vértice, Archer e Merrill propõem que Jefté e Sansão foram contemporâneos, pois a opressão amonita coincidiu com a dos filisteus. O texto de Jz 10.7 “indica claramente que Sansão e Jefté devem ter sido contemporâneos, sendo que a opressão dos amonitas e a dos filisteus ocorreu aproximadamente na mesma época”[7]. Analisando Jz 13.1, Merrill conclui que “Juízes 13.1a. serve como uma ponte literária que conduz à primeira referência, e não pretende sugerir uma seqüência Jefté-Sansão”[8].
Não há nada no texto que implique uma sucessão imediatamente subseqüente entre o juizado de Eúde, Sangar e o de Débora. Ou seja, o juizado de Débora poderia ter se iniciado no final do período de paz de 80 anos e durado mais 40 anos. Assim, o juizado de Débora poderia ter durado mais de 40 anos, coexistindo com um tempo de paz situado entre os oitenta. É uma sugestão.
Seja o que for, os acontecimentos descritos no livro são datados de 1380 a 1050 a.C, havendo variações que não afetam substancialmente a historicidade dos eventos.

IV) Contexto internacional
Relativamente ao império egípcio, o período dos juízes corresponde ao “período de Amarna”, cujo expressão técnica mais apropriada seria Reino Novo. Denomina-se “período de Amarna” justamente por causa das famigeradas Cartas de Amarna, consistentes em placas de barro escritas em cuneiforme oriundas dos babilônios, que trazem valiosas descobertas arqueológicas, podendo inclusive denotar o pedido de socorro dos cananeus aos egípcios em virtude da invasão dos hebreus[9] sob o comando de Josué.
Esse período marcou o enfraquecimento do império egípcio, cuja influência na Palestina estava em franca decadência.
Amenotep III se entregou à luxúria; mais preocupado com obras monumentais, erigiu o famoso templo de Amom em Luxor. Seu sucessor, Amenotepe IV, conhecido também como Akhenatem (1376-1362 a.C), direcionou seus esforços à religião, promovendo uma reforma religiosa.
Nesse ínterim, na mesopotâmia, os hurrianos prevaleceram sobre os hititas, até que Suppiluliumas conseguiu consolidar o Império Hitita, aproveitando-se da crise egípcia, e, mediante tratado político, subjugou o reino hurriano de Mitani.
Os cassitas dominavam a Babilônia, até serem destruídos pelos Elamitas. Numa das cartas de Amarna, o rei Cassita pede auxílio ao Faraó Amenotep IV contra a expansão hitita.
Na região do Líbano os amorreus, que outrora se estabeleceram como estado-tampão, servindo ora como vassalos do Egito, ora dos Hititas, foram subjugados definitivamente por Suppiluliumas, que durou até o final do século XIII a.C.
No entanto, o Egito se recuperou, de forma que Seti I conquistou a Galiléia e a Fenícia, em 1318 a.C, e derrotou os hititas. Três anos depois, celebrou um tratado com Mursilis II, de sorte que a Síria ficou com os hititas, ao passo que a Palestina e a Fenícia com os egípcios.
No ano de 1296 a.C, sucedeu a famosa batalha de Kadesh entre hititas governados por Muwattalis e egípcios governados pelo notável Ramsés II, sendo por este quebrado o tratado de paz anterior.
Em 1279 a.C, após longa batalha sangrenta sem um vencedor, o hitita Hattusilis III celebrou um tratado de paz com o egípcio Ramsés II.
A paz foi mantida até o declínio do império hitita. A leste os hititas enfrentavam a crescente ameaça assíria e a oeste lutaram contra uma horda de invasores bárbaros.
Esses invasores bárbaros conquistaram Creta em 1.200 a.C. Por conseguinte, os filisteus foram forçados a se deslocarem para o oriente, estabelecendo-se na costa Palestina.
Os povos do mar, identificados como filisteus, tentaram invadir o Egito nos dias de Merneptá (1234-1225 a.C), mas foram derrotados, instalando-se em Canaã. A vitória egípcia deu ensejo à famosa Estela de Israel, em que se menciona pela primeira vez na história extrabíblica o nome Israel.
Também sob Ramsés III (1197-1165 a.C), uma nova horda de povos do mar ou filisteus foram repelidos do Egito, consolidando-se na Palestina.
Uma questão intrigante é o silêncio eloqüente do Livro de Juízes a respeito das incursões e domínio egípcio na Palestina. No entanto, se se ater ao propósito histórico-redentivo do livro, essa omissão deixa de ser grave. Esses episódios não tiveram pertinência teológica, conquanto fossem historicamente relevantes. Ademais, há uma explicação geográfica, a saber, os egípcios não tiveram contato com os israelitas visto que estes habitavam nas colinas e montanhas, ao passo que aqueles atravessavam as planícies e vales.
Todavia, as opiniões não são uníssonas, há quem defenda que os egípcios eram aliados dos hebreus, não obstante toda opressão e incursões, de modo que o autor do livro de juízes não quis relatar tal desavença[10].
Os cananeus se organizavam na forma de cidades-estado e cultuavam geralmente Baal e Astarote.
Astarote é o plural de Astarte, uma deusa adorada pelos cananeus. Era a deusa mãe, relacionada à fertilidade, amor e guerra. Essa deusa equivale à Ishtar, deusa da Mesopotâmia, oriunda do sincretismo acádico, que, por sua vez, é identificada com Inanna, deusa mãe da Suméria. Baal, cujo significado é senhor, possuidor ou marido, é o grande deus dos cananeus relacionado à fertilidade.
Os cultos cananeus eram caracterizados pela ubiqüidade dos altos e promiscuidade. Os outeiros eram os locais apropriados para a adoração. Cada outeiro poderia se tornar num local de adoração a Baal. Nos cultos havia muita orgia. Era uma forma de representar o relacionamento sexual dos deuses, com o objetivo de alcançar a fertilidade da terra e das criações.
Nos cultos cananeus também havia sacrifício de crianças.
O domínio da Palestina não estava consolidado nas mãos de algum império, porquanto os impérios poderosos da época, Hitita e Egípcio, não detiveram o controle definitivo e perene da região, justamente porque havia constantes embates e disputas maiores, proporcionando liberdade para que os novos ocupantes israelitas pudessem habitar naquela terra.
Por outro vértice, a ocupação israelita esteve restrita às montanhas, de forma que os vales permitiam o acesso dos egípcios e demais habitantes da Palestina.

V) Contexto Nacional
O grande libertador, Moisés, e seu fiel sucessor, Josué, precederam os juízes. Após a geração do notável líder e general Josué, a unidade de Israel bem como a religiosidade da nação entrou em colapso.
O que se observa claramente no livro de Juízes é a infidelidade da nação, que amiúde retornava às práticas pagãs, idolatrando os deuses cananeus, Baal e Astarote. Seguidamente, Deus enviava a punição, de sorte que o povo se arrependia, clamando ao Senhor. Deus, em sua riquíssima misericórdia, atendia as súplicas, propiciando livramento, por meio de juízes. Esse ciclo se repete no livro.
Abalando-se o alicerce da nação, qual seja, a aliança com Deus, a política entrou em colapso. Não havia unidade política entre as tribos, pelo contrário, se vislumbra dissensões resolutas entre algumas tribos, culminando até em guerras, e neutralidade em outras.
Isso foi reflexo da falta de uma liderança pujante, espiritualmente dedicada ao Senhor. O livro de Juízes não vincula o caos com a mera ausência de um monarca. Indubitavelmente, a ausência de um líder espiritual contribuiu, mas em suma a raiz está na desobediência do povo. Contudo, a obediência do povo está atrelada a um pastor, líder, rei que conduziria o povo à retidão como foi o rei ideal Davi, prefigurando o Rei dos reis, o Messias, Jesus!
Todavia, essa desagregação tem sido entendida com uma anfictionia, ou seja, uma federação de tribos. Contudo não concordamos com isso, com efeito, “o cenário de uma federação tribal frouxamente organizada, mal capaz de reunir seus membros em uma emergência de guerra (cf. Jz 5.16, 17), se encaixa melhor no livro do que uma liga bem organizada de cidades-Estado, conforme exibida pelos filisteus”[11] .

VI) Comentários dos capítulos

1. Capítulo 1-2
Após a morte de Josué[12], o povo de Israel continuou as incursões contra os habitantes da Palestina. No entanto, apenas se preocuparam com a estratégia militar, porquanto buscaram ao Senhor objetivando saber quem deveria partir para o ataque primeiro (v. 1).
Não se preocuparam em clamar ao Senhor pedindo um líder, um sucessor de Josué. Isso teve conseqüências negativas. Deus respondeu a oração na medida do interesse do povo. Somente em momentos de opressão o clamor do povo se intensificou, de modo que o Senhor levantava juízes ou líderes.
Naquele momento, a fidelidade do povo estava atrelada a uma liderança eficaz. À medida que o povo se desviava, o governo entrava em colapso, se desestruturando completamente.
Um outro erro foi a não expulsão dos povos restantes que habitavam na Palestina. Isso culminou num sincretismo religioso, resultando na quebra da aliança. Moisés já havia alertado o povo sobre a opressão advinda da não aniquilação dos habitantes da Palestina (Nm 33.55, 56). Em vez de aniquilarem os cananeus, preferiram torná-los tributários. O que parecia lucro se tornou um enorme prejuízo.
Assim sendo, o primeiro capítulo serve de base para o livro. Isto é, o que aconteceu no livro é resultado do que ocorreu com a geração que sobreviveu após a morte de Josué e com a subseqüente. A primeira não expulsou completamente os cananeus. A segunda não conheceu ao Senhor, tornando-se presa fácil do sincretismo religioso.
A tribo de Judá e Simeão pelejaram contra os cananeus, porquanto agora o inimigo não era mais os amorreus, mas os cananeus. Prenderam o rei cananeu Adoni-Bezeque, e tomaram Jerusalém.
O texto bíblico descreve uma prática comum no Antigo Oriente Médio: cortar os polegares das mãos e dos pés. Isso incapacitava as pessoas para o serviço militar.
Mas Jerusalém não era controlada pelos jebuseus, sendo conquistada por Davi (2Sam 5.6)? O próprio versículo 21 não contradiria o versículo 8? Jz 1.8 apenas relata que naquele tempo Judá assumiu o controle de Jerusalém, não mencionando, contudo, que, posteriormente, perdeu-o para os jebuseus. Ademais, o v. 8 não relata um controle total e perene da cidade. Portanto, tudo indica que a vitória descrita no v. 8 foi apenas parcial não implicando ocupação completa e exclusiva.
A tribo de Judá obteve vitórias parciais, pelo que só ocupou a região montanhosa, ao passo que não conseguiu ocupar o vale, porquanto os moradores possuíam carros de ferro. Os acessórios, como o eixo, seriam de ferro, ao passo que a carcaça seria de madeira.
Como os cananeus poderiam ter usado carros de ferro se a Idade do Ferro se iniciou por volta de 1200 a.C.? A cronologia adotada para esse relato não estaria defasada? A Idade do Ferro não significa que não houvesse qualquer uso pontual e localizado desse material. A propósito, os hititas já dominavam essa tecnologia no início do século XIV a.C, de sorte que os cananeus poderiam ter importado tal técnica[13].
Halley pondera que as escavações denotaram que havia muitas relíquias de ferro na Filístia no ano de 1.100, todavia nenhum artefato de ferro na região montanhosa da Palestina até 1.000[14].
As famosas cidades de Gaza, Ascalom e Ecrom foram conquistadas por Judá[15] (1.18), mas no ano de 1200 a.C os povos do mar, a saber, a segunda leva de filisteus, ocuparam essas cidades, estabelecendo suas cidades-estado.
As demais tribos, Benjamim, Manassés, Efraim, Zebulom, Aser, Naftali e Dã, também não conseguiram expulsar e aniquilar totalmente os cananeus. Repise-se que esse relato consiste no prelúdio do caos.
Somente a tribo de Issacar não foi mencionada. Talvez porque naquele período a tribo ainda permanecia remissa em conquistar sua herança (Js 18.3), ou estivesse se amalgamado com as demais (Jz 10.1).
A terra dos hititas mencionada no v. 26 refere-se ao território situado na Síria, inferindo que os arameus estavam sob o poderio ou influência hitita.
O capítulo 2.1-7 relata uma teofania em que o Anjo do Senhor aparece ao povo e repreende-o por não ter aniquilado os habitantes da Palestina, alertando sobre a futura opressão que afligiria o povo. Durante esse episódio Josué ainda estava vivo.
Imediatamente após a morte de Josué e da geração que vivia nos seus dias, a nova geração apartou-se da fé verdadeira, adorando Baal e Astarote (2.13).
Em seguida, o restante do capítulo 2 resume todo o livro de Juízes, descrevendo o ciclo repetido de apostasia, arrependimento, clamor e libertação.

2. Capítulo 3
Antes de relatar a primeira opressão, o livro especifica ou reitera que o povo de Israel habitava junto a outros povos ou fazia fronteira com eles, com o objetivo de provar o povo de Deus.
Os filisteus que habitavam nas montanhas do Líbano até à entrada de Hamate são oriundos da primeira leva de povos do mar que habitaram na Palestina, provavelmente nos dias do Faraó Merneptá.
Os hititas também habitavam no meio do povo de Israel. Esses hititas conseguiram se consolidar na região e habitavam mais ao norte de Israel em decorrência possivelmente da estabilidade e prosperidade do império hitita sob o governo de Suppilluliumas (1380-1346 a.C).
A primeira opressão foi levada a cabo pelos arameus, mais especificamente pelo rei da Mesopotâmia (em hebraico Arã-Naharaim, Arã dos dois rios), Cusã-Risataim. Conquanto a Mesopotâmia fosse controlada nessa época pelos hititas, conflitos com o reino amorreu de Mitani e com os assírios permitiram que os arameus localizados na Síria pudessem proceder a conquistas independentes ou até mesmo capitaneados por Suppilluiumas.
Nessa época o Egito não exercia alguma influência na região.
Todavia, a pessoa de Cusã-Rizataim não é uníssona, pelo que certos eruditos identificam-no com “um rei hitita que anexara o norte da Mesopotâmia, região também conhecida como Mitani, tendo ampliado seus domínios até o onterior da terra de Israel”[16].
Após o clamor do povo, Deus levantou o juiz Otniel para libertar o povo daquela opressão que já durava oito anos.
Esse juiz libertou o povo, de forma que o povo teve paz por quarenta anos.
Constata-se que os juízes mencionados nesse livro não exerciam exclusiva ou necessariamente a função jurídica. Não eram reis stricto sensu. Uma forma de classificá-los foi usar esse termo. A propósito, textos antigos cananeo-ugaríticos usam o mesmo termo para reis.
Novamente o povo caiu na apostasia, de modo que foram subjugados pelos moabitas governados por Eglon. Os moabitas fizeram uma coalizão com nações vizinhas, a saber, os amonitas (nação irmã) e os amalequitas, um povo tribal descendente de Esaú que habitava no Negueb. A opressão durou 18 anos. Tal opressão foi localizada, restrita à região de Jericó (cidade das palmeiras).
Em virtude do clamor do povo, Deus escolheu Eúde para libertá-lo. Posteriormente, sobreveio um período de paz totalizando 80 anos. Essa duradoura paz coincidiu com o tratado de paz estabelecido entre os hititas e egípcios no ano de 1315 a.C até sua ratificação.
Com efeito, Deus usou esse momento para proporcionar paz ao seu povo eleito. No sentido de entender que a situação era providencial convém citar o elucidativo comentário:

Nem os egípcios nem os heteus parecem ter compreendido sua função providencial, mas permanece o fato que os anos durante os quais cada um deles conseguiu manter a paz na Palestina corresponderam aos próprios períodos que Deus havia assinalado proporcionando ‘paz’ ao Seu povo[17].

Relativamente ao juizado de Sangar, não houve qualquer datação, mas tão-somente é mencionada sua façanha contra os filisteus, com vistas a encorajar os leitores a lutarem contra os inimigos, inclusive contra os mesmos.[18] É possível que os seiscentos filisteus feridos por Shangar (Jz 3.31) fossem povos do Mar penetrando através do norte[19]. O texto bíblico não descreve com detalhes, mas os filisteus fizeram incursões contra Israel antes de Sansão e Samuel. Está em pauta a primeira leva de filisteus, ocorrida em 1230 a.C, os quais foram rechaçados pelos egípcios, vindo então a ocupar a Palestina.

3. Capítulo 4
A próxima apostasia resultou numa opressão violenta e dura. Jabim, rei de Hazor, cananeu, liderava a opressão que durou vinte anos e afetou basicamente as tribos do norte de Israel.
Obviamente esse Jabim não é o mesmo destruído por Josué (Js 11). O nome Jabim era um título e não um nome pessoal. E, o tempo da destruição de Hazor por Josué até o juizado de Débora é um lapso razoável para a reconstrução da cidade.
A cronologia baixa do Êxodo tem dificuldade para encaixar essa destruição e reconstrução de Hazor.
A vantagem dos cananeus em relação aos israelitas pode ser medida pelos novecentos carros de ferro que o rei possuía (4.3).
Esse texto revela um dado importante, a saber, o uso do ferro, de modo que é razoável fixar essa data entre 1240 e 1220, porquanto o uso freqüente do ferro só sucedeu em Canaã a partir de 1200.
Deus usou uma juíza para libertar o povo, visto que Baraque não quis lutar sem a presença dela. Débora julgava o povo de Israel naquele período. A sede da jurisdição ficava entre Ramá e Betel, nas montanhas de Efraim, mais ao norte de Israel.
Outrossim, quem deu o golpe final no capitão do exército de Hazor, Sísera, foi outra mulher, uma singela e destemida esposa de um queneu, filho de Hobabe, sogro de Moisés: Jael.
Os queneus habitavam junto com o povo de Israel (1.16), uma vez que Moisés e seu sogro permaneceram juntos após o Êxodo e durante a caminhada no deserto, entrando na terra prometida.
Eles laboravam com metais. E, possivelmente, Héber, se aliou a Jabim, a fim de estar mais seguro, ao invés de permanecer com os israelitas. O comentário da Bíblia NVI afirma que Héber anunciou a Sísera que Baraque havia subido ao monte Tabor.
O cântico de Débora (5.20-21) indica que uma inundação do rio Quisom auxiliou na vitória.
Tudo indica que a jurisdição de Débora foi nacional e não localizada, conquanto o norte de Israel sofresse mais com a opressão. A priori, Débora convocou as tribos de Zebulon e Naftali para pelejarem contra os cananeus. Todavia o cântico de Débora e Baraque denota que outras tribos foram convocadas, contudo não atenderam tal convocação. As tribos que atenderam a convocação foram: Efraim, Benjamim, Maquir de Manassés (Js 17.1), Issacar. A tribo de Rúbem apenas deliberou, não participando. Gade, Aser e Dã não participaram das lutas. Judá e Simeão tampouco foram mencionadas.
Esse texto denota a falta de unidade na nação de Israel. Já pode ser vislumbrada a divisão da nação. O isolamento de algumas tribos e a rivalidade entre outras contribuíram para falta de unidade política na nação de Israel.
O caos político de Israel provocado pela idolatria causava inseguranças e instabilidades, sendo um ambiente propício para a proliferação de bandidos e salteadores que atacavam os transeuntes. Jz 5.6 revela implicitamente a presença desses salteadores que deixavam as cidades desertas.
Após a vitória de Débora, a terra experimentou um período de paz que durou 40 anos. Esse período coincide com o governo de Ramsés III, o último Faraó de destaque.

4. Capítulo 6-8
A opressão sob os midianitas (uma povo que tinha afinidade com os ismaelitas, descendentes de Ismael, filho de Abraão) durou sete anos. Conquanto não fosse um período relativamente longo, foi tempo suficiente para inspirar o medo e o terror no meio da nação de Israel, em virtude das fortes e arrasadoras incursões perpetradas pelos inimigos, que se aliaram com os amalequitas e povos do oriente.
Com vistas a permanecerem em locais seguros e garantir o pouco de alimento que sobrava, os filhos de Israel precisavam se abrigar em covas situadas nos montes. O povo tinha de improvisar se quisesse guardar o que sobrava. Até o lagar foi usado para malhar o trigo. Isso mostra a constante ameaça que o povo sofria além dos saques que já haviam ocorrido, pois somente uma pouca quantidade de trigo poderia ser debulhado num lagar. Geralmente, o trigo era debulhado por animais e num lugar aberto que tivesse ventilação apropriada para separar a palha do trigo.
Deus levantou a Gideão para livrar o povo da opressão. O pai de Gideão era um adorador de Baal. Possuía um altar dedicado ao ídolo, que ficava junto a um bosque.
A luta foi travada no vale de Jezreel. Gideão convocou as tribos de Manassés, Aser, Zebulom e Naftali. Pelas tribos convocadas verifica-se que a opressão não envolvia todo o território nacional, mas aquela região.
A consulta dirigida ao Senhor por meio de um velo de lã informa o grau de superstição de Gideão, que mesmo tendo uma experiência com o Anjo do Senhor, ainda teve dúvida, consultando ao Senhor através daquele meio. Poderia ter consultado ao Senhor através do Urim e Tumim, que era uma prática legitimada pelo Senhor.
Gideão e seus famosos trezentos soldados conseguiram derrotar os midianitas. Estes tentaram fugir por um caminho que atravessa a tribo de Efraim. Então, Gideão convocou a tribo de Efraim, a qual conseguiu prender dois príncipes dos midianitas.
Uma contenda fútil surgiu entre a tribo de Efraim e Gideão, que era da tribo de Manassés (Js 17.2). É pertinente repisar que no período de Juízes as tribos de Israel não possuíam coesão e unidade, pelo contrário, eram marcadas pelas intrigas, animosidades, inércia e muita falta de patriotismo, como se cada tribo fosse autônoma e independente das demais. Mais adiante o autor de Juízes ressalvará que a falta de uma liderança nacional influente que agregasse toda a nação, constituindo um reino coeso e unido, ou seja, a falta de um rei, causava esse caos, de forma que cada pessoa “fazia o que parecia bem aos seus olhos” (17.6; 18.1). O interesse local e individual preponderavam sobre o interesse da nação, das tribos, do povo de Israel.
Isso é notado na forma como as cidades de Sucote e Peniel, pertencentes à tribo de Gade, trataram a Gideão, quando este estava no encalço dos midianitas; pedindo alimento para saciar seu exército, foi-lhe negado pelas cidades (8.5-17). Como conseqüência, Gideão lhes infligiu um castigo severo, matando alguns de Peniel.
Em função desse estado desagregador e caótico, muitos críticos tendem a ver essa situação como o status quo ante, ou seja, este era o estado de Israel: uma anfictionia, composta de várias tradições e tribos cujas origens não são as mesmas, porém que se agregaram e aos poucos se constituíram um reino.
Tal assertiva é totalmente falsa e não passa de mera teoria como a da evolução, sem qualquer evidência nesse sentido. É o mesmo que olhar para o macaco e por causa de sua semelhança com o homem deduzir que este veio daquele. A aparência não implica descendência. O fato de Israel ter tomado a forma de uma anfictionia, com costumes e interesses distintos não significa que tiveram tradições e origens distintas
A vitória sobre os midianitas foi tão extraordinária e salutar que o povo de Israel viu na pessoa de Gideão um bom partido para governar Israel, de modo que o pedido foi: “governa ( מְשָׁל ) sobre nós”. Em que pese não haver um líder nacional, o povo sentia essa carência. Todavia, ao invés de buscarem esse rei pela via da humilhação e fidelidade à aliança, preferiram o caminho mais curto e simplista do mero pedido.
Conquanto Gideão tivesse recusado a liderança, fez um objeto de culto para reunir o povo e tentar preservar a unidade em torno daquele objeto. Mas isso foi um tropeço para Gideão, pois a nação de Israel se dirigiu ali para praticar rituais cananitas que envolviam a prostituição ( hn*z* ).
Nos dias de Gideão a terra sossegou 40 anos.

5. Capítulo 9-10
Aproveitando-se da morte de seu pai que recusou a liderança, Abimeleque o usurpador e conspirador forjou uma ocasião propícia para se tornar rei. Abimeleque, cujo nome significa “meu pai é rei”, uma alusão a Deus como rei, não seguiu o exemplo de abnegação de seu pai Gideão, e buscou o reinado, matando seus irmãos.
Naquele momento, o povo da região de Siquém adorava um tal de Baal-Berite, senhor da aliança, que até possuía uma casa. É notório o sincretismo religioso. YHWH, o Deus da Aliança celebrada com Abraão, é identificado como Baal.
A própria cidade que apoiou Abimeleque se voltou contra ele por influência de Gaal. Por isso, Abimeleque pelejou contra Siquém, matando várias pessoas. Todos siquenitas que se esconderam na casa de Baal-Berite foram mortos. Mas Abimeleque foi ferido por uma mulher, e para resguardar sua honra e não morrer pelas mãos de uma mulher pediu a seu moço que o matasse, o que aconteceu.
Mais uma vez se constata a crise espiritual e social da nação. Idolatria e guerras internas sempre estavam presentes. Os israelitas idólatras se esconderam na casa do ídolo acreditando que o falso deus os protegeria e que o próprio Abimeleque respeitasse aquele lugar santo, porquanto se costumava respeitar os lugares santos, não profanando-os com a morte de pessoas. Mas nada disso aconteceu.
Fica evidenciado que a religião de Abimeleque era o seu próprio interesse e sua avidez pelo poder.
Após a queda de Abimeleque, os juízes menores, Tola de Issacar, Jair de Gileade ou Manassés, entram em cena.
Tola sucedeu Abimeleque. O juizado de Tola está relacionado com a morte de Abimeleque, de modo que sua missão de libertação estava relacionada com o caos produzido por Abimeleque.
Merril propõe que o juizado de Jair era concomitante com o juizado de Jefté, uma vez que os locais eram distintos, propugnando a data de 1094-1072 para Jair e 1106-1100 para Jefté.
Uma nova apostasia se inicia, e desta vez o sincretismo foi bem abrangente, incluindo, além das divindades cananitas, as divindades oriundas dos sírios (arameus), moabitas, filisteus e amonitas, entre as quais se destacam: Moloque, divindade nacional amonita; Dagom, divindade filisteu; Camos divindade moabita; Hadade, Mote, Anate e Rimom, deuses de Arã.
Como resultado natural sobrevieram as opressões sob os amonitas e filisteus, cuja duração totalizou 18 anos. Essas duas opressões foram concomitantes. Os amonitas eram responsáveis pela região nordeste ao passo que os filisteus pela região sudoeste de Israel.
Deus levantou Jefté para conter a opressão amonita e Sansão para deter a opressão filisteu.
A opressão filisteu só foi suprimida completamente nos dias do rei Davi.

6. Capítulo 11 e 12
A pérola do capítulo 11 está no versículo 26, em que Jefté, à guisa da diplomacia, tentou sem êxito persuadir os amonitas a abortarem a opressão, visto que a terra pleiteada por eles já estava com Israel há trezentos anos. Os amorreus haviam conquistado aquela terra dos amonitas; em seguida os israelitas conquistaram-na dos amorreus e não dos amonitas. Assim, o pleito de Amom era improcedente. Uma vez que Amom não reclamou a terra nos dias dos amorreus, e tampouco nos dias da conquista israelita levada a cabo por Moisés, agora qualquer reclamação seria inoportuna.
A menção de Jefté, de que Israel estava naquela terra há trezentos anos, serve de marco para se fixar a cronologia dos juízes, ainda que de forma lacônica, sem maiores detalhes e precisão.
A mensagem enviada por Jefté se coaduna com a correspondência internacional da época.
O povo de Gileade se reuniu em Mizpá à busca de um líder. Observe-se a carência de uma liderança. Jefté, gileadita e filho de uma prostituta, liderou a libertação, sendo, inclusive, tomado pelo Espírito do Senhor.
Jefté fez um voto temerário, interpretado por muitos como um sacrifício da própria filha. Embora o precedente de Jefté não fosse tão bom, filho de uma prostituta, amigo de homens levianos, pertencente a um período de apostasia e caos espiritual, político e social, Jefté não sacrificou sua filha, mas tão-somente a entregou à castidade perpétua, haja vista o próprio comentário do autor sagrado, de que ela não conheceu homem e chorava pela virgindade. Ademais, não há qualquer censura mais veemente ao voto. Caso houvesse sacrifício humano, o autor sagrado faria algum comentário mais enfático sobre tão terrível abominação. Era de se esperar o mesmo comentário de Jz 19.30: “Nunca tal se fez, nem se viu desde o dia em que os filhos de Israel subiram da terra do Egito, até ao dia de hoje; ponderai isto, considerai e falai”.
Após a vitória sobre os amonitas, a tribo de Efraim contendeu contra Jefté. Em vez de usar da mesma diplomacia, Jefté partiu para a batalha. Mais uma batalha ocorreu entre os israelitas, agora, se tornando mais extensa, pois envolveu duas tribos. Nos dias de Abimeleque a batalha envolveu apenas cidades.
Constata-se que a nação de Israel caminhava para o caos espiritual, político e social. A cada dia a situação se agravava um pouco mais. A necessidade de um líder se tornava mais premente. Isso explica a euforia do povo pedindo um rei nos dias de Samuel.
Após Jefté, Ibzã de Belém julgou Israel por sete anos. Em seguida, Elom de Zebulom julgou a Israel dez anos, sendo sucedido por Abdom de Efraim cujo juizado durou oito anos. Merril ressalva que estes juizados “podem ter sido simultâneos, totalmente ou em parte”[20] O texto indica uma sucessão cronológica e não uma concomitância entre os juizados. A justaposição de juízes nesse momento não parece plausível.

7. Capítulo 13-16
Sansão foi o juiz incumbido de libertar o povo de Israel da opressão filistéia. Os filisteus oprimiram Israel durante quarenta anos. Os atos miraculosos e extraordinários ocorridos na vida de Sansão denotam a capacitação outorgada pelo Espírito do Senhor. No entanto, suas falhas e pecados abriram uma brecha em sua vida que foi bem aproveitada pelo inimigo, de modo que Sansão não conseguiu libertar Israel completamente do jugo filisteu, contudo impediu a consolidação da opressão e conquista filistéia.
Sansão quebrou seu voto de nazireu previsto em Nm 6, comendo alimento impuro, e permitindo que seu cabelo fosse cortado. Seu envolvimento com mulheres filistéias foi um tropeço.
Jz 14.10-12 relata a participação de Sansão em uma festa de casamento e usando enigmas. Festas e enigmas eram práticas comuns no Antigo Oriente. As festas duravam sete dias, e possuíam convidados especiais do noivo, que eram responsáveis pela segurança da festa.
O fogo ateado por Sansão nas plantações dos filisteus denota que era uma época de seca, visto que a colheita do trigo era feita nesse período, sendo muito propício para queimadas. Sansão usou raposas ou chacais. Até hoje esses animais são encontrados em Israel.
Finalmente, os filisteus conseguiram prender Sansão, explorando a dificuldade de Sansão com o sexo oposto. Sansão cedia facilmente aos apelos “românticos” de sua companheira, fazia tudo para provar seu amor. Este costume é tão antigo e atual quanto se imagina. Desde a criação até hoje as mulheres usam essa tática para conquistarem seus companheiros. E muitos homens continuam caindo nessa armadilha.
Após prenderem Sansão, os filisteus furaram os olhos dele, conforme o costume de tratar os prisioneiros de guerra. Os filisteus humilharam Sansão, pondo-o para girar um moinho de pedras que servia para moer grãos. Esse tipo de trabalho era humilhante para um líder, pois era trabalho de mulher e de escravos (Ex 11.5; Is 47.2)
Como gratidão, ofereceram um grande sacrifício ao seu deus, Dagom, visto que acreditavam que Dagom entregara Sansão nas mãos dos filisteus.
Dagom era a principal deidade dos Filisteus, embora adorassem as mesmas divindades cananéias. O mesmo fenômeno havido entre os acádicos sucedeu entre os filisteus: houve sincretismo religioso, e a religião era menos regionalizada e mais nacionalizada.
O comentário da Bíblia de Estudo NVI acrescenta:

Embora os filisteus adorassem a maioria dos deuses de Canaã, suas deidades prediletas parecem ter sido Dagom e Baal-Zebube. O nome Dagom é igual a uma palavra hebraica que significa “grão”, o que faz supor que era uma deidade da vegetação. Era adorado na Babilônia já no segundo milênio a.C. Baal-Zebube era adorado em Ecrom (2Rs 1.2,3,6,16). O nome significa “senhor das moscas”, uma alteração deliberada feita pelos seguidores do Senhor (Iavé) para ridicularizar e protestar contra a adoração a Baal-Zebul (“Baal, o príncipe”), nome conhecido nos textos cananeus antigos (v. Mt 10.25; 12.24).[21]

Ainda assim, pela graça de Deus, a oração de Sansão foi respondida, de modo que teve a oportunidade de acabar com aquele vexame, porquanto movendo as colunas do templo, derrubou-o sobre si e sobre os filisteus matando mais pessoas naquele momento que durante toda sua vida.

8. Capítulo 17-21
Estes capítulos, considerados como apêndices, retratam por meio do episódio de Mica e do levita e sua concubina o zênite da degradação israelita, de modo que ressalta a depravação total do povo de Israel.
O comentário do Novo Dicionário da Bíblia data esse acontecimento do primeiro período de apostasia de Israel, na época do juiz Otoniel. A tradição judaica concorda com tal posição.
Segundo o comentário da Bíblia de Estudo NVI, “os acontecimentos narrados se deram, segundo parece, razoavelmente cedo no período dos juízes (v. notas em 18.30; 20.1,28)”, porquanto se faz alusão ao neto de Moisés, sacerdote Finéias.
Nesses capítulos pode ser observado a assimilação da cultura cananéia pelos israelitas. Encontram-se os mais abomináveis pecados contra a Lei de Deus e Seus dez mandamentos: furto, sincretismo religioso e idolatria na família de Mica; sacerdócio corrompido do levita de Belém de Judá que vagueava pelas montanhas de Efraim; idolatria da tribo de Dã; adultério da concubina de outro levita; homossexuais maníacos e estupradores assassinos oriundos de Gideá da tribo de Benjamim.
O estupro seguido de morte da concubina do levita perpetrado pelos homossexuais maníacos de Benjamim causou espanto na nação culminando na declaração registrada em 19.30: “Nunca tal se fez, nem se viu desde o dia em que os filhos de Isarel subiram da terra do Egito até ao dia de hoje; ponderai isto, considerai, e falou”.
Somente um fato estarrecedor desse jaez mobilizou a nação como se fosse “um só homem” desde Dã até Berseba, de modo que se congregaram em Mizpá. A nação decidiu punir aqueles homens, executando-os. Assim, “unidos como um só homem”, ajuntaram-se contra a cidade de Gibeá pedindo à tribo de Benjamim que entregasse aqueles homens.
Para piorar, a tribo de Benjamim não entregou aqueles homens, pelo contrário, decidiu lutar contra as demais tribos.
Por conseguinte, mais uma luta interna assolou a nação, quase culminando na extinção da tribo de Benjamim. Mais um voto temerário foi feito agora por todas as tribos, pois juraram que não dariam mais mulheres aos Benjamitas. Dessa forma, a tribo seria extinta. Mas, para contornar esse voto temerário, à guisa do jeitinho brasileiro, permitiram que os benjamitas raptassem as mulheres de outras tribos.
Mesmo diante desse caos registrado nesses últimos capítulos, ainda é possível vislumbrar um nobre costume do oriente: a hospitalidade.

VII) Bibliografia
ARCHER, Gleason L., Jr. Merece Confiança o Antigo Testamento? 4ª ed., São Paulo: Vida Nova, 2003.

BAXTER, Sidlow J.. Examinai as Escrituras. 1ª ed., São Paulo: Vida Nova, 1993, vol 2.

Bíblia de Estudo de Genebra, São Paulo: Cultura Cristã, 1999.

Bíblia de Estudo NVI, São Paulo: Vida, 2005.

Bíblia de Jerusalém, São Paulo: Paullus, 1973.

Bíblia Vida Nova, São Paulo: Vida Nova, 1998.

BRIGHT, John. História de Israel. 1ª ed., São Paulo: Paulinas, 1978.

DOUGLAS, J.D.. (ed). O Novo Dicionário da Bíblia. 2ª ed., São Paulo: Vida Nova, 1995.

ELLISEN, Stanley. A.. Conheça Melhor o Antigo Testamento. 1ª ed., São Paulo: Vida, 1991.

HALLEY, Henry H. Manual Bíblico: um comentário abreviado da Bíblia. 4ª ed., São Paulo: Vida Nova, 1994.

LEONEL, João. Teologia Bíblica dos Livros Históricos e Proféticos. São Paulo: Mackenzie, apostila da aula 5, 2008.

MERRILL, Eugene H.. História de Israel no Antigo Testamento. 1ª ed., Rio de Janeiro: CPAD, 2001.

MESQUITA, Antônio Neves de. Povos e nações do mundo antigo. 5ª ed., Rio de Janeiro: JUERP, 1989.

PINTO, Carlos Osvaldo Cardoso. Foco e desenvolvimento do Antigo Testamento. 1ª ed., São Paulo: Hagnos, 2006.

SCHULTZ, Samuel J. A história de Israel. 1ª ed., São Paulo: Vida Nova, 1977.
[1] O texto da LXX traz 440. No entanto a recensão de Luciano de Antioquia segue o TM. Por tratar-se de uma voz isolada e com divergência na própria tradição do texto, o TM há de prevalecer.
[2] PINTO, 2006 p. 221
[3] DOUGLAS, 1995, p. 889
[4] ARCHER, 2003, p. 201
[5] MERRILL, 2001, p. 150
[6] PINTO, 2006, p. 221
[7] ARCHER, 2003, p. 200
[8] MERRILL, 2001, p. 178
[9] Nos textos de Amarna o povo hebreu é chamado de Habiru. Para uma discussão do termo vide Archer, 2003, p. 187-194.
[10] MESQUITA, 1989, p. 156
[11] PINTO, 2006, p. 223
[12] O aparato crítico da BHS afirma que o texto original provavelmente registraria Moisés em vez de Josué, sugerindo que Josué ainda estava vivo nessa época, combinando com 2.6 e Js 15.13. No entanto, não há qualquer indício textual objetivo dessa assertiva. Pelo contrário, todos os Mss hebraicos, LXX, Vulgata e Peshita concordam com o Texto Hebraico. Logo, à míngua de evidência, é mister rejeitar o aparato.
[13] Cf. ARCHER, 2003, p. 148
[14] HALLEY, 1994, p. 159
[15] A LXX afirma que não foi tomada. No entanto, é uma voz isolada, pelo que os demais manuscritos e traduções (e.g. Vulgata e Peshita) corroboram o Texto Massorético. Logo, não há razões plausíveis para desacreditar o TM.
[16] Schultz, 1977, p. 104
[17] DOUGLAS, 1995, p. 887.
[18] Ainda que o livro tivesse sido escrito nos dias do reinado de Davi, Israel conhecia a história de Sangar, mas nos dias de Golias ninguém se lembrou disso, com exceção de Davi.
[19] MERRIL, 2006, p. 161
[20] MERRILL, 2006, p. 178.
[21] Bíblia de Estudo NVI

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Características de uma igreja viva

CARACTERÍSTICAS DE UMA IGREJA VIVA
“A igreja, na verdade, tinha paz por toda a Judéia, Galiléia e Samaria, edificando-se e caminhando no temor do Senhor, e, no conforto do Espírito Santo, crescia em número” (At 9.31).
1. Deus havia escolhido um povo para ser seu instrumento de proclamação da salvação. Agora, com a vinda de Jesus ao mundo, este privilégio é estendido a todo aquele que crê nele como Salvador e Senhor. Assim a Igreja torna-se o novo povo chamado e justificado pelo próprio Deus. Em Jesus Cristo, pessoas de características e origens diferentes são reunidas para dar um real significado à história humana na proclamação do Evangelho. A missão do novo povo é levar todas as pessoas à reconciliação com Deus por meio de Cristo. Diz o apóstolo Pedro: “Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz” (1Pe 2.9).
CINCO CARACTERÍSTICAS DESTE POVO DE DEUS
PRIMEIRA – A IGREJA É UM POVO ESCOLHIDO. É Deus quem age e escolhe um povo para si. Como povo, existimos porque Deus agiu graciosamente em nosso favor. Isso não é fruto do nosso esforço, mas do amor de Deus.
SEGUNDA – A IGREJA É UM POVO PEREGRINO. A Igreja é formada de “estrangeiros residentes”. Não somos deste mundo mas estamos no mundo. Por isso, a Igreja não se apega ao mundo, mas também não sai do mundo. A Igreja assume responsabilidades como “luz do mundo e sal da terra”.
TERCEIRA – A IGREJA É UM POVO DA ALIANÇA. Deus chama pessoas para estabelecer com ele um pacto de fidelidade que gera vida nova, real e concreta neste mundo. Disse Jesus: “Assim brilhe também a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai que está nos céus” (Mt 5.16).
QUARTA – A IGREJA É UM POVO QUE TESTEMUNHA. Ela aponta para o agir de Deus em nosso meio ontem e hoje. Também olha para o futuro e testemunha que a nossa redenção se aproxima. “... mas recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito Santo, e sereis minhas testemunhas tanto em Jerusalém como em toda a Judéia e Samaria e até aos confins da terra” (At 1.8).
QUINTA – A IGREJA É UM POVO SANTO. Ela não é santa por si mesma, mas por meio daquele que ela adora e proclama: “Adorai o SENHOR na beleza da sua santidade; tremei diante dele, todas as terras” (Sl 96.9). Esse Deus adorado em sua santidade faz com que ela, a Igreja, seja diferente do mundo.
2. A Igreja constituída de pessoas e de famílias é um núcleo abençoado de infinito valor. A totalidade das igrejas locais forma a Igreja do Senhor. Cada igreja local desempenha o papel relevante diante de Deus, no lugar em que surgir. Cristo, ao dirigir-se às Igrejas do Apocalipse, escrevendo sua carta mensageira a cada uma delas, escreve também a cada Igreja nos dias de hoje. Termino esta nota pastoral com os versos de um autor desconhecido:
HINO DA IGREJA CRISTÃ
1. Levantando de Cristo a bandeira,
No calvário pungente surgiu
Uma Igreja ditosa e altaneira,
Que na cruz o Senhor redimiu.
2. Sob a luz da Sagrada Escritura,
Da oração do eterno Senhor,
O caminho da Igreja fulgura,
Refletindo o divino esplendor.
3. Sobre o mar proceloso da vida,
Ponde em Cristo a fiel diretriz,
Segue a barca da Igreja remida,
Rumo certo ao destino feliz.
4. É uma Igreja que nunca se abate,
Fortaleza na Rocha eternal!
Tem em Cristo, no Santo combate,
O penhor da vitoria imortal.
5. Quando Cristo, entre nuvens brilhantes,
Retornar majestoso em poder,
Ó Igreja em louvores vibrantes,
Vai com fé teu Senhor receber.

Pr. João Arantes Costa