quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Bodas de Caná

Perguntas:
1) Esse milagre foi realmente o primeiro?
2) Qual é o significado do v. 4?
3) Os discípulos realmente creram em Jesus como o Cristo naquele momento?
4) Esse milagre tem algum significado espiritual?

Contexto:
O texto analisado vem após o contato de Jesus com seus primeiros discípulos. Jesus já havia afirmado nesse diálogo com Natanael que Coisas maiores seriam observadas e que daquele momento em diante o céu estaria aberto e os anjos de Deus subiriam e desceriam sobre o filho do homem (1.50-51).
Em seguida, o evangelista fala sobre a expulsão dos mercadores do templo de Jerusalém, e que após a realização de outros milagres ali, muitos que viram creram.

Exposição
O milagre da transformação da água em vinho dá início às coisas maiores preditas por Jesus. Conquanto esse milagre esteja ausente dos demais evangelhos, não há razões para duvidar de sua autenticidade, até porque os evangelhos não objetivam ser historicamente precisos e cronológicos, antes porém, visam transmitir a mensagem de que Jesus é o Cristo segundo o escopo peculiar de cada evangelista e tendo em vista o destinatário da mensagem.
O versículo 11 pode transmitir a idéia de que ali em Caná Jesus fez o principal milagre. Até porque a palavra grega traduzida por primeiro ou início é ἀρχὴν , e pode ser traduzida por principal. Uma variante textual, cujo principal testemunho é o P66 em sua leitura original e P75, utiliza a palavra grega proto que significa primeiro. Diante dessa variante bem antiga e da possibilidade de se traduzir a palavra arche como primeiro, é coerente entender a explicação do evangelista como o primeiro milagre realizado por Jesus.
Diante da falta de vinho, Maria interpela Jesus. É possível que Maria estivesse servindo às pessoas e, notando a falta de vinho, comunicasse a Jesus, haja vista que nessas festas somente os homens participavam da formalidade cerimonial. Por que Maria foi falar com Jesus? Se o texto realmente denota que esse milagre foi o primeiro – e é isso que o texto indica - então Maria dirigiu-se até Jesus crendo que Ele poderia fazer algo, em função de sua experiência com o nascimento miraculoso de Jesus. Ou seja, a fé de Maria em Jesus baseava-se no milagre do seu nascimento, ocorrido há 30 anos atrás!
A resposta de Jesus é intrigante. O que Jesus quis dizer com: “Mulher, que tenho eu contigo? Ainda não é chegada minha hora.”
A primeira frase é um hebraísmo, ou seja, uma expressão hebraica que remonta os tempos de Davi. Em 2Sm 16.10 e 19.22. Nessas duas passagens Davi usa essa expressão para discordar de Abisai, filho de Zeruia. E denota que quem fala tem absoluta independência daquele para quem é dito, de forma que não há relação obrigação ou subordinação. Davi não estava obrigado a seguir os conselhos de Abisai, porquanto não era subordinado a este.
Da mesma forma, o texto denota que Jesus não tinha essa relação de subordinação para com sua mãe. O fato de Ele chamar sua mãe de mulher, denota a absoluta independência de Jesus em relação ao pedido de Maria.
Portanto, Jesus não estava obrigado a resolver aquele problema da falta de vinho, que certamente envergonharia o noivo e sua família, visto que as festas de casamento duravam dias, até uma semana, e não era bom que faltasse bebida aos convidados. O que Jesus estaria por fazer era resultado de sua livre e soberana graça.
A segunda expressão fala da hora de sua glorificação, a saber, sua morte e ressurreição. Isso é indicado por trechos paralelos no próprio evangelho (7.6, 30; 8.20; 12.23; 13.1). No entanto, há intérpretes que defendem que esse trecho fala do momento de sua revelação messiânica.
Com efeito, Jesus quis fazer alusão a sua missão precípua: morrer na cruz. Visto ser esse evento o principal e imprescindível para redimir a humanidade. Mas por que Jesus teria suscitado essa questão? Não estaria fora de contexto? Não. Os discípulos do Senhor não poderiam “esperar de Cristo somente nessa vida”, não deveriam esperar que Jesus realizasse milagres e prodígios até os 120 anos. A missão de Cristo era dar sua vida em favor dos Seus. E Jesus quis ressaltar isso. Mesmo falando constantemente que ele haveria de padecer, os discípulos não entendiam, pelo contrário, Pedro até tentou dissuadir Jesus a abandonar essa missão.
Após a resposta, Maria fala para os serventes obedecerem Jesus. Não obstante a negação de Jesus, ela ainda confiava que Jesus atenderia seu pedido, não porque fosse obrigado a fazê-lo, mas por amor e graça.
Os serventes obedecem ao Senhor. Enchem os vasos de água e ainda levam ao encarregado da festa. Era um ato de não pouca fé: levar água para o encarregado experimentar. Mas a surpresa foi a reação do encarregado: provou o melhor vinho! Em seguida repreendeu o esposo por ter guardado o melhor vinho, pois era costume servir o melhor e depois o pior. Mas o esposo fez diferente. Ele não, Jesus fez a diferença.
Esse milagre serviu para manifestar a glória do Senhor. A palavra glória doxa traduz o hebraico kabod que significa honra, majestade, importância. E realmente esse milagre manifestou a grandeza e majestade de Jesus. Os profetas incluíram o vinho como símbolo das bênçãos que o Senhor traria no grande dia messiânico, de julgamento e restauração. Esse milagre serve é um sinal de que a era messiânica está raiando; um antegozo das bênçãos futuras, do banquete que será preparado por Jesus. Os convidados experimentaram o melhor vinho feito por Jesus. Mas algo muito melhor está sendo preparado pelo esposo aos seus convidados, a saber, Jesus à Igreja.
Consequentemente, os discípulos creram em Jesus. Nós sabemos que essa fé não era a fé salvífica e plena. Pois tal fé só foi exercida após a ressurreição do Senhor e aparição aos discípulos. Isso se coaduna com a explicação de João quando afirma que muitos creram em Jesus mas Jesus não confiava neles (1.23-24) e quando muitos discípulos abandonaram Jesus (6.66). Essa fé ainda era incipiente e estava em formação, sendo aperfeiçoada mais tarde.
Mas esse belíssimo sinal serviu apenas para manifestar a glória de Jesus? O evangelista não teceu maiores digressões acerca desse sinal, com fez com os demais. Talvez Jesus não tenha falado nada mesmo. Todavia, todos que leem esse trecho não hesitarão em dizer que esse sinal ensina a transformação que Jesus faz em nossas vidas.
E por certo, esse sinal também demonstra isto: que Jesus tem o poder de transformar algo em outra coisa que segundo as leis da química tem uma fórmula totalmente distinta e salutar.
O texto seguinte relata que Jesus expulsou os mercadores do templo e disse que derrubaria aquele templo e em três dias o reergueria. Isso era uma alusão ao seu corpo. Sua morte colocaria fim ao sistema religioso da aliança feita no Sinai por intermédio de Moisés onde houve o derramamento de sangue de um animal e inauguraria a nova aliança consumada no Calvário, por meio de Jesus e por seu sangue.
Isso pode ser um indicativo de que João quisesse depreender desse sinal a transformação que Jesus faria em relação ao sistema religioso até então vigente. Tal interpretação se coaduna com a declaração de Jesus nos sinópticos sobre o vinho novo referindo-se à nova aliança e, também, sobre o recipiente em que o vinho estava: vasos usados para purificação dos judeus.
A marca distintiva dessa nova aliança é a regeneração, a transformação que o Espírito Santo faz na pessoa (Ez 36.25-27; Jr 31.31-33), que se manifestada pelo novo nascimento. Assim sendo, uma pessoa que nasce de novo na verdade é uma pessoa que sofreu uma transformação semelhante à da água para o vinho.
Aqueles recipientes usados para purificação estavam ali para proporcionar purificação aos judeus, que eram considerados impuros pelo simples fato de tocarem pessoas impuras (cf. o livro de Levítico). Mas, pelo poder de Cristo, uma pessoa é totalmente transformada sem qualquer necessidade de rituais externos, que apenas simbolizavam a completa purificação realizada por Cristo, não havendo mais necessidade de tais rituais.
Não poucos católicos usam esse texto para justificar a intercessão de Maria, dizendo que se pedir para a Mãe o Filho atenderá. No entanto, o texto não fala em hipótese alguma sobre a intercessão de Maria em favor de alguém. Primeiro porque Maria estava viva ainda, e segundo porque o próprio Jesus demonstra em sua declaração a ausência de subordinação em relação a Maria. Jesus está subordinado ao Pai, e só devemos pedir ao Filho para que o Pai atenda-nos (14.13,14; 16.23,24).

Cristologia: Jesus é o Cristo. O milagre manifesta a majestade de Jesus, seu poder e soberania sobre as leis da natureza.
Soteriologia: Os sinais serviram para estimular a fé dos discípulos. Mas hoje, devemos crer sem ver; embora às vezes Deus possa usar sinais para trazer pessoas a Cristo. Outrossim, esse milagre descreve a transformação que Jesus pode fazer no coração de uma pessoa.
Escatologia: Esse sinal indica a alteração que estaria por vir ao sistema religioso judaico. Algo totalmente novo surgiria.
Mariologia: O texto não pode jamais ser usado como prova de que Maria intercede, uma vez que não há qualquer indicação de que ela possa fazer isso após sua morte, e tampouco o texto quer ensinar sobre a intercessão de santos ou da própria Maria.

Esboço:
1) Jesus transformou a água em vinho

2) Jesus transformou a religião de Deus em outra totalmente nova

3) Jesus transformou a vida de pessoas em novas criaturas

Jesus transforma a vida de quem crer

Um comentário:

Anônimo disse...

Oi Ta...mais uma vez vc tem falado de forma muito abençoada.
Que Deus continue te dando muita sabedoria.
Bjosss de sua irmã,
Taís