quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

DECEPCIONADOS COM A GRAÇA

RESENHA DO LIVRO ESCRITO POR PAULO ROMEIRO

O livro segue a mesma linha dos outros livros[1], SuperCrentes e Evangélicos em Crise: proporciona um panorama geral do movimento neopentecostal e suas doutrinas, e, após, refuta as doutrinas com base em citações bíblicas esparsas, via de regra sem uma exposição exegética e mais profunda dos textos bíblicos. Isso não quer dizer que estejam mal aplicadas, apenas que o significado poderia ser mais explorado e aprofundado. Caso contrário, parece um disputa de textos bíblicos, do tipo “quem tem mais versículos”.
Pela leitura dos livros do Paulo Romeiro infere-se que ele perfilha a teologia pentecostal, conquanto nesse livro ele aponte críticas ao próprio pentecostalismo. No entanto, ainda fica subentendido a relação amistosa e vivencial com o pentecostalismo, visto que as críticas ao movimento ainda são brandas, quase inócuas.
Aliás, o livro até fala do movimento pentecostal como avivamento, o que não há como concordar, visto que os avivamentos bíblicos e históricos foram totalmente distintos e opostos do que aconteceu em Los Angeles no ano de 1906. Outrossim, o livro ainda trata as seitas neopentecostais e algumas pentecostais como evangélicas, o que é inadmissível, haja vista a distância abissal desses movimentos em relação às Igrejas fundadas nas Escrituras Sagradas. Não se tratam de pontos heréticos de somenos importância, pelo contrário, as doutrina fundamentais do cristianismo consubstanciada nos cinco solas é totalmente substituída pela salvação pelas obras e ausência de ênfase e pregação acerca do novo nascimento pela fé em Jesus Cristo, sem falar no exacerbado arminianismo dominante nessas igrejas.
Repisando, todos os livros do autor têm algo em comum: não são muito exegéticos e teológicos, no sentido de tecer uma pesquisa mais acurada, ampla e profunda dos textos bíblicos. As citações bíblicas são aleatórias, não havendo uma exposição do texto consoante a interpretação histórico-gramatical. A análise dos versículos bíblicos é muito superficial.
Assim sendo, os livros do autor carecem de uma exegese sólida e consistente das Escrituras Sagradas.
Talvez isso seja herança do próprio movimento do qual ele se origina. Analisando com mais detalhes a biografia do autor, fica mais fácil compreender a característica hermenêutica do autor.
O autor converteu-se ao evangelho por meio do movimento pentecostal, tornando-se membro e líder da Assembléia de Deus. Sua formação acadêmica inicial não foi teológica, mas secular. Após, se especializou nos estudos teológicos[2].
Dessa forma, o estilo do autor reflete sua formação e origem. Pela leitura dos livros, nota-se uma total ausência de citação de renomados teólogos ou reformados, e dos grandes nomes da história do cristianismo, da completa falta de afinidade com as doutrinas da graça de Deus – a despeito das muitas citações que não tirou a impressão de trabalho acadêmico, de conclusão de curso.
A propósito da graça de Deus, o livro propiciou uma abordagem assaz superficial, quase imperceptível. Se o próprio título do livro fala sobre a decepção com a graça, era de esperar uma exposição mais exegética e enfática da maravilhosa e soberana graça de Deus.
Isso não quer dizer que os livros perderam sua utilidade. Pelo contrário, mesmo com tais limitações, o livro ainda possui muito valor, sendo de proveitosa serventia, mormente aos afiliados ao movimento pentecostal[3] e neopentecostal.
O linguajar simples e objetivo do autor pode auxiliar muitas pessoas a se afastarem dos perigos neopentecostais, bem como refletir sobre a ótica pastoral, com vistas à restauração e cuidado das pessoas decepcionadas com a falsa graça, vendida no mercado gospel.
O autor poderia substituir o título – uma sugestão: a miséria da teologia da prosperidade – ou ao menos justificá-lo, colocando, por exemplo a palavra graça entre aspas. Porquanto ninguém se decepciona com a genuína graça de Deus. Pelo contrário, a graça nos basta! Assim, o autor poderia ser mais enfático e taxativo classificando como falsa graça, uma graça barata, o que querem vender como graça.
A abordagem pastoral do autor poderia ser mais aprofundada, utilizando-se de livros clássicos como Pastor Aprovado de Richard Baxter, entre outros autores puritanos. Creio que o trabalho poderia ser muito enriquecido com uma sucinta explanação da história da Igreja, e do trabalho pastoral nesses períodos, ou seja, qual era o modus vivendi da igreja nos principais períodos históricos. Uma vez que o próprio livro analisa a história e prática do movimento pentecostal, a história e prática da igreja seria muito pertinente. Sobretudo, a análise da igreja primitiva poderia ser mais confrontada com a praxe pastoral hodierna.
No tocante aos trabalhos de teológicos de outros autores, alguns títulos de John Piper seriam pertinentes ao livro, como O Sorriso Escondido de Deus, de forma a propiciar outras formas salutares de abordagem do sofrimento e dos males causados pelo movimento neopentecostal.
Em vez disso, o autor destacou basicamente dois teólogos – para mim, desconhecidos, um pelo menos é liberal, e sem uma influência mais pujante, de pequeno calibre, se comparado aos renomados teólogos do cristianismo, não obstante os títulos obtidos; nada contra esses dois teólogos, mas como disse, o trabalho poderia ser enriquecido um pouco mais – de forma que não fundamentou muito suas explanações nas Escrituras, mas tão-somente limitou-se a citar a exposição deles.
Na página 192, se declara que a oração de Jesus não foi atendida, mas creio que isso não se harmoniza com o contexto, pelo que o próprio Jesus retificou imediatamente sua petição, rogando que se fizesse a vontade do Pai.
Não obstante a característica menos exegética e expositiva do livro, porém mais narrativa, fazendo uso de citações bíblicas esparsas, bem como a falta de interação com teólogos clássicos e renomados, o livro cumpriu seu mister: alertar sobre os perigos do neopentecostalismo, e refletir sobre propostas pastorais para acolher as pessoas decepcionadas com esse movimento.
Com efeito, não há propostas prontas, imediatas e simples. A questão exige uma reflexão maior, e pormenorizada, que extrapolaria o escopo do livro.
Certamente, pela graça de Deus, esse livro será útil e valioso como foram os outros dois títulos do autor.
[1] Já li os outros dois livros do Paulo Romeiro: SuperCrentes e Evangélicos em Crise
[2] http://pt.wikipedia.org/wiki/Paulo_Romeiro
[3] Converti-me numa igreja pentecostal, Assembléia de Deus, e, por causa de um presbítero dessa igreja, aderi por um tempo à teologia de Keneth Hagin e demais advogados da teologia da prosperidade. Graças a Deus, o livro do Paulo Romeiro, Evangélicos em Crise, veio num momento muito oportuno para mim, pelo que pude abrir os olhos para as heresias ensinadas e praticadas na Igreja da qual era membro.

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